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A esquerda política sempre adorou entusiasticamente o trabalho. Ela não só elevou o trabalho à essência do homem, mas também mistificou-o como pretenso contra-princípio do capital. O escândalo não era o trabalho, mas apenas a sua exploração pelo capital. Por isso, o programa de todos os «partidos de trabalhadores» foi sempre «libertar o trabalho» e não «libertar do trabalho». A oposição social entre capital e trabalho é apenas uma oposição de interesses diferenciados (é verdade que de poderes muito diferenciados) internamente ao fim em si mesmo capitalista. A luta de classes era a forma de execução desses interesses antagônicos no seio do fundamento social comum do sistema produtor de mercadorias. Ela pertencia à dinâmica interna da valorização do capital. Se se tratava de luta por salários, direitos, condições de trabalho ou postos de trabalho: o pressuposto cego continuava sempre sendo a Roda-Viva dominante com seus princípios irracionais.

Tanto do ponto de vista do trabalho quanto do capital, pouco importa o conteúdo qualitativo da produção. O que interessa é apenas a possibilidade de vender de forma otimizada a força de trabalho. Não se trata da determinação em conjunto sobre o sentido e o fim da própria atividade. Se houve algum dia a esperança de poder realizar uma tal autodeterminação da produção dentro das formas do sistema produtor de mercadorias, hoje as «forças de trabalho» já perderam, e há tempos, esta ilusão. Hoje interessa apenas o «posto de trabalho», a «ocupação» – já esses conceitos comprovam o caráter de fim em si mesmo de todo esse empreendimento e a menoridade dos envolvidos.

O que, para que e com que conseqüências se produz, no fundo não interessa, nem ao vendedor da mercadoria força de trabalho, nem ao comprador. Os trabalhadores das usinas nucleares e das indústrias químicas protestam ainda mais veementemente quando se pretende desativar as suas bombas-relógio. E os «ocupados» da Volkswagen, Ford e Toyota são os defensores mais fanáticos do programa suicida automobilístico. Não só porque eles precisam obrigatoriamente se vender só para «poder» viver, mas porque eles se identificam realmente com a sua existência limitada. Para sociólogos, sindicalistas, sacerdotes e outros teólogos profissionais da «questão social», este fato é a comprovação do valor ético-moral do trabalho. Trabalho forma a personalidade. É verdade. Isto é, a personalidade de zumbis da produção de mercadorias, que não conseguem mais imaginar a vida fora de sua Roda-Viva fervorosamente amada, para a qual eles próprios se preparam diariamente.

Assim como não era a classe trabalhadora enquanto tal a contradição antagônica ao capital e o sujeito da emancipação humana, assim também, por outro lado, os capitalistas e executivos não dirigem a sociedade seguindo a maldade de uma vontade subjetiva de explorador. Nenhuma casta dominante viveu, em toda a história, uma vida tão miserável e não livre como os acossados executivos da Microsoft, Daimler-Chrysler ou Sony. Qualquer senhorio medieval teria desprezado profundamente essas pessoas. Pois, enquanto ele podia se dedicar ao ócio e gastar sua riqueza em orgias, as elites da sociedade do trabalho não podem se permitir nenhum intervalo. Mesmo fora da Roda-Viva, eles não sabem fazer outra coisa consigo mesmos a não ser infantilizarem-se. Ócio, prazer intelectual e sensual lhes são tão estranhos quanto o seu material humano. Eles mesmos são servos do deus-trabalho, meras elites funcionais do fim em si mesmo social irracional.

O deus dominante sabe impor sua vontade sem sujeito através da «coerção silenciosa» da concorrência, à qual precisam se curvar também os poderosos, sobretudo quando administram centenas de fábricas e transferem somas milionárias pelo globo. Se eles não fizerem isso, são colocados de lado do mesmo modo brutal como as «forças de trabalho» supérfluas. Mas é justamente sua menoridade que faz com que os funcionários do capital sejam tão incomensuravelmente perigosos, e não a sua vontade subjetiva de exploração. Eles são quem têm menos direito de perguntar pelo sentido e pelas conseqüências de suas atividades ininterruptas, não podem permitir a si mesmos sentimentos nem considerações. Por isso eles falam de realismo quando devastam o mundo, tornam as cidades cada vez mais feias e deixam os homens empobrecerem no meio da riqueza.

«"O trabalho tem cada vez mais a boa consciência ao seu lado: atualmente a inclinação para a alegria chama-se ‘necessidade de recreação’ e começa a ter vergonha de si mesma. ‘Deve-se fazer isto pela saúde’ assim se diz quando se é surpreendido num passeio pelo campo. Pois logo poder-se-á chegar ao ponto em que a gente não mais ceda a uma inclinação para a vida contemplativa (isto é, a um passeio com pensamentos e amigos) sem má consciência e desprezo de si». (Friedrich Nietzsche, Ócio e Ociosidade, 1882)»


Manifesto Contra o Trabalho
Trabalho é um princípio coercitivo social Trabalho e capital são os dois lados da mesma moeda Trabalho é domínio patriarcal
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