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“A propriedade é impossível, pois é homicida” P.-J. Proudhon

Por meio da crítica de Proudhon à propriedade privada dos meios de produção, chegamos à conclusão que, independente do período de capitalismo a que nos refiramos, há um fato comum: a exploração.

Essa exploração do homem pelo homem provém do capitalismo, cujo principal pilar é a propriedade privada dos meios de produção. No entanto, o que são os meios de produção?

Os meios de produção constituem-se pelos meios de trabalho e pelos objetos de trabalho. Os meios de trabalho são os instrumentos de produção como as máquinas, os equipamentos, as ferramentas, a tecnologia; as instalações como os edifícios, armazéns, escritórios; as fontes de energia utilizadas na produção que podem ser elétricas, hidráulicas, nucleares, eólicas; e os meios de transporte. Os objetos de trabalho são os elementos sobre os quais ocorre o trabalho humano como as matérias-primas minerais, vegetais e animais, a terra, dentre outras.

O processo de exploração pela propriedade privada acontece da seguinte forma: o proprietário detém os meios de produção e, por diversos formas, dentre elas a contratação de trabalhadores que recebem salários, apropria-se de parte do seu trabalho, pois não lhes paga os frutos completos daquilo que produzem. Este excedente do trabalho alheio apropriado pelo proprietário é conhecido como mais-valia.

Proudhon enfatizava que a um indivíduo, o máximo que lhe pode ser pago pelo trabalho, é aquilo que ele mesmo pode produzir. Enfatizava, em O Que é a Propriedade de 1840, que “se o direito de ganho pudesse sujeitar-se às leis da razão e da justiça, ficaria reduzido a uma indenização ou reconhecimento cujo máximo não ultrapassaria jamais, para um único trabalhador, certa fração do que ele é capaz de produzir (1) ”. Ou seja, a um indivíduo, o máximo que lhe poderia ser pago, seria o total daquilo que ele produziu.

Isso constituiria a base de seu raciocínio sobre a exploração por meio da propriedade privada. Ao empregar um número de trabalhadores, por exemplo, a tendência do patrão será sempre a de pagar a eles o menor salário possível e receber a maior quantia possível de dinheiro por seus trabalhos. Ou seja, ter o mínimo custo e o maior lucro.

Na época de Proudhon, tanto ele quanto outros socialistas que faziam uma crítica do sistema capitalista, ao discutir a teoria do valor, colocavam como um “mínimo necessário” a ser pago pelo trabalhador o valor de seu custo de vida (alimentação, saúde, vestimentas, etc.). No sistema de hoje, as coisas já não são mais assim. O mínimo a ser pago, é o mínimo aceito pelo “mercado” e como há muitos trabalhadores em situações gravíssimas de desemprego, subemprego, etc., muito provavelmente, sempre haverá alguém disposto a receber menos pelo trabalho realizado. E se valor pago pelo proprietário não puder pagar as despesas do custo de vida do trabalhador? Ele que se vire para conseguir outras fontes de renda ou reduzir ainda mais seu padrão de vida.

Ao apropriar-se de uma parte do trabalho realizado por seus trabalhadores, o patrão - ou o detentor da propriedade privada - aparece, para Proudhon, como um usurpador, um ladrão. Isso porque o que é justo, em sua concepção, é que cada um receba os frutos completos de seu trabalho e, a partir do momento que, por ser o detentor da propriedade, o patrão lhes paga o mínimo possível, com o objetivo de acumular o máximo possível, apropriando-se de parte do valor de seu trabalho, o proprietário constitui-se um ladrão. É por isso que Proudhon afirmará, neste mesmo livro, que a propriedade é um roubo. E por que isso?

Porque a propriedade privada dos meios de produção constituirá ao proprietário uma forma injusta de enriquecer. A propriedade oferecerá ao proprietário o enriquecimento injusto pelo arrendamento, pelo ganho de aluguel, pelo recebimento de juros, e também pelo recebimento da mais valia de seus trabalhadores assalariados.

E a ganância do proprietário não tem limites, na maioria dos casos. Proudhon continua afirmando que “o proprietário não se contenta com o ganho tal como o bom senso e a natureza das coisas lhe asseguram: quer ser pago dez, cem, mil, um milhão de vezes (2)”. E para atingir este objetivo, o proprietário não medirá esforços. Isso levará Proudhon a concluir sua quarta proposição do porque a propriedade é impossível, dizendo: “[...] a propriedade, após despojar o trabalhador pela usura, assassina-o lentamente pelo esgotamento; ora, sem a espoliação e o assassinato a propriedade não é nada; com a espoliação e o assassinato ela logo perece, desamparada: logo, é impossível (3)”.

A crítica da propriedade privada pode ser aplicada, além de no sistema de trabalho assalariado, também nos sistemas de escravismo e servidão. Isto porque muda a forma de exploração, mas a essência do sistema não. É, da mesma maneira, um sistema em que alguns poucos detêm a propriedade e, por este motivo, apropriam-se do trabalho de outros muitos (em maior ou menor proporção, dependendo do caso), sendo responsáveis pela exploração. É certo, ainda, que esta crítica também pode perfeitamente aplicar-se ao sistema “socialista” de Estado. Nos sistemas “socialistas” do século XX - como foi o caso da ex-URSS -, o papel do Estado pode ser claramente classificado como o de “patrão”, visto que “emprega” seus trabalhadores, afastando-os das tomadas de decisão e sustentando a hierarquia em seu seio; não há término da exploração e da alienação. Nestes casos, a mais-valia dos trabalhadores do Estado continuou a ser roubada, da mesma forma. E este roubo nunca voltou ao povo, sequer como um benefício oferecido pelo Estado.

É certo que as relações do século XXI estão modificadas. No entanto, as críticas de Proudhon continuam válidas e, se em alguma medida precisam de atualização, há aspectos que estão em plena contemporaneidade.

  • Artigo produzido como contribuição ao Grupo de Estudos do Anarquismo que, em seu programa Anarquismo: Federalismo e Organização, havia discutido o capítulo “A Propriedade é Impossível pois é Homicida” do livro O que é a Propriedade, de P.-J. Proudhon em julho de 2007.

1) Proudhon, P.-J.. O que é a Propriedade. São Paulo: Martins Fontes, 1988 p. 154.

2) Ibidem p. 154.

3) Ibidem p. 159.

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